segunda-feira, junho 13, 2005

Em Defesa dos Censurados pela Rede Globo

Finalmente Manassés me repassou o texto que produziu no dia posterior à palestra do jornalista Carlos Siqueira no curso de Comunicação; a palestra ocorreu dia 29 de março contudo, o artigo conserva-se atual tanto pelo fato particular que aborda quanto porque remete a uma discussão bem mais ampla em torno da ética jornalística e dos limites da profissão -- pelos dois motivos justifica-se a postagem.
Nem é preciso dizer mas, os comentários sobre o texto abaixo, representem eles expressão de apoio ou reprovação ao ponto de vista de seu autor, serão muito bem-vindos -- principalmente os daqueles que acompanharam a cobertura feita por Carlos Siqueira.
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por Manassés de Oliveira
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Em virtude da palestra ministrada pelo Sr. Carlos Siqueira, na noite do dia 29 de março na Sala das Eletivas do curso de Comunicação Social da UEPB, faz-se necessário corrigir uma abordagem feita pelo palestrante na ocasião.

Quando o repórter referiu-se a um caso noticiado por ele na TV Paraíba que acabou tendo repercussão internacional, veio à tona a necessidade de se fazer uma reflexão sobre a ética no jornalismo.

O caso em questão diz respeito à fuga consentida de alguns presos da cadeia pública de Picuí. Segundo a reportagem, o motivo da debandada teria sido o fato da aproximação do fim do mundo, segundo as previsões do médico e astrólogo francês Nostradamus. Para o carcereiro Jaime Geminiano, “já que o mundo ia mesmo acabar, todos os presos deveriam ser libertados”.
A imprensa noticiou este fato de forma sensacionalista. Os presos na verdade fugiram porque o carcereiro sofria de uma doença muito comum a qualquer ser humano: o alcoolismo; o fato ocorreu dois dias antes da data em que, segundo o vidente, acabaria o mundo; as autoridades picuienses só noticiaram a ocorrência um dia antes da confirmação da profecia, justamente para dar um efeito surreal à notícia e, o repórter Carlos Siqueira, segundo ele mesmo, entrevistou o carcereiro “quando ele ainda fazia bico”, ou seja, quando o homem ainda estava sob o efeito do álcool.

Que coisa boa, finalmente o jornalista ganhou destaques nacional e internacional, deu um grande “furo” de reportagem para a imprensa global, acrescentou esta vitória ao seu currículo e, de quebra, ainda conseguiu uma história quixotesca para divertir as platéias em suas palestras. Mas o jornalismo paraibano não parou para pensar que o indivíduo que estava sendo ridicularizado naquele instante era um ser humano, pai de algumas filhas, marido de uma mulher, irmão de outros irmãos e membro de uma sociedade onde ficou gravada a sua história. Que este mesmo personagem não teve direito à defesa, que foi abordado enquanto ainda estava sob efeito do álcool, que não tinha um timbre de voz tão alto quanto os geradores de som e imagem do conjunto das agências de notícias brasileiras e estrangeiras e, que, após alguns meses de sofrimento, ridicularização popular e principalmente isolamento social, veio a falecer vítima de Acidente Vascular Cerebral (AVC) em decorrência da depressão que lhe foi causada pela repercussão da matéria do Sr. Siqueira.

Jornalismo sem ética, sem observar todas as partes envolvidas, também assassina histórias, desmoraliza todo o povo de um estado, ridiculariza o nosso país no exterior, aumenta o preconceito contra nordestinos no Centro-sul.

O que aconteceu com o Sr. Jaime Geminiano foi o mesmo que ocorreu com um casal de idosos proprietários de uma escola de base no estado de São Paulo que, após uma acusação feita pela mesma inatingível Rede Globo de Televisão, o supra-sumo da “verdade” jornalística do nosso país, teve a sua escola depredada, sofreu todo tipo de violência física e moral na cadeia e nas ruas e, após uma investigação, foi inocentado. Daí a Globo pediu desculpas em público, mas até hoje, não se sabe se todos os telespectadores do Brasil assistiram ao Jornal Nacional no dia do recuo da “todo-poderosa” ou mesmo se o casal atingido pela mentira da emissora de TV, recuperou a auto-estima bem como o seu patrimônio depois que a poeira baixou.

É por isso que o Sr. Jaime Geminiano falou, naquele momento, que “quando nos dão uma pancada no corpo, basta cuidarmos da ferida para que o nosso organismo volte à sua constituição natural. Mas quando a agressão é moral, aí dá mais trabalho para se encontrar a cura”. O personagem da matéria morreu em decorrência da repercussão da notícia veiculada pela empresa do “Dr. Roberto”, mas o então repórter Carlos Siqueira pôde finalmente, após anos de anonimato, adentrar no seleto clube dos profissionais do padrão globo de jornalismo.

Um comentário:

Lenildo Ferreira disse...

O TEXTO DO COLEGA MANASSÉS PROPÕE A ANÁLISE MAIS COERENTE DE UM PROBLEMA QUE, SE É GRAVÍSSIMO NO BRASIL, MUITO MAIS O É NA PARAÍBA, ONDE JORNALISTAS SEDENTOS DE FAMA E FALTOS DE CAPACIDADE SE PROPÕE A TUDO PARA ATINGIR A "FAMA". O CASO DE CARLOS SIQUEIRA É UM BOM EXEMPLO. ENTRETANTO, TOMEMOS O CUIDADO DE NÃO IDOLATRARMOS OS ANTI-HERÓIS - COMO TAMBÉM É COSTUME NESSE PAÍS - PORQUE O SENHOR JAIME TAMBÉM NÃO ERA LÁ TÃO INOCENTE ASSIM. NÃO SEJAMOS PARCIAIS AO CONDENAR A PARCIALIDADE.